terça-feira, 12 de maio de 2009

Entrevista com Mendigos

A multidão os observa, a fim de afastar-se deles. O odor fétido que exalam não permite que sejam abraçados pela sociedade. Poucos têm coragem de estender a mão e tocar os corpos desses pobres seres humanos. Muitos se enojam com suas existências, os repugnando e chamando-os de restolhos da sociedade.

Quantas vezes você tocou a mão de um mendigo? Alguma vez abraçou-lhe num gesto terno?

Julgamo-nos melhores que tantas pessoas. Buscamos defeitos nos outros para proclamar nossas qualidades. Os moradores de ruas, mendicantes, exalam mau cheiro do corpo físico. Alguns de nós lançam o odor putrefato da alma, mesmo que externamente usemos os melhores perfumes. Enquanto julgamos que os mendigos sofrem de males sociais, nós sofremos internamente, na mais excitante sociedade que o ser humano pode ter: aquela que mantém com seu foro intimo, que deriva de suas entranhas, das profundezas do próprio ser.

Entrevistando mais de 20 moradores de rua, mendigos, convenci-me de muitas verdades parciais que procuro disseminar. Também, pude comprovar quão poucas são as verdades inquestionáveis na existência humana. Muitos acumulam riquezas durante toda uma vida. Não se preocupam com valores que deveriam nortear a vida. Porém, não acumulam sabedoria para aproveitar tudo que conquistaram. Mostram-se felizes social e publicamente, ainda que nas suas veias corra o líquido insalubre da depressão, da angústia, do sofrimento latente.

Outros, nada acumularam, senão um apinhado de trapos, que servem agora de vestes nos dias frios. Não se preocupam com a aparência social e pública. Não estão “nem aí” para o que dita a moda, para aquilo que a mídia noticia como elegante, atual e bonito. Não se incomodam com os viscos da face que não denotam sua idade física, mas que mostra com precisão sua idade existencial. Será que também sofrem internamente?

Qual é o propósito da vida do ser humano? Os mendigos são de fato sofredores? O que exalam externamente é semelhante ao que tentam ocultar internamente? Quem sofre mais: um miserável morador de rua? Ou um miserável abastado que mora num palácio?  O que é pior: viver na miséria absoluta do “ter” ou ter e viver na miséria plena do “ser”?   Buscamos incessantemente riqueza material para, segundo acreditamos, encontrar a felicidade. Somos tolos, pois a felicidade não se encontra, ela se constrói e não é um objetivo a ser atingido, é uma busca e uma conquista diária. Conforme forem nossas ações, decisões, comportamentos, será a nossa felicidade.    Nessa entrevista, conheci pessoas cujo traje social é visivelmente desprezível, todavia, a opulência das suas palavras e experiências são arrebatadoras e mostram os caminhos do sucesso, ao revelarem as trilhas do fracasso, trilhada e talhada por pessoas que decidiram, em algum momento da sua vida, erroneamente.

Muitas delas não são felizes. Choram, se entristecem, as lembranças os fazem derramar lágrimas, que parecem agir como lâminas em suas faces. Lamentam o passado, condenam o presente e não têm qualquer expectativa profícua em relação ao futuro. Outras riem à toa, tudo é belo, ainda que, no íntimo, seu olhar não revele tanta alegria.

  A maioria delas não sofre pela falta de alimento, vestuário, dinheiro. O que mais as abala é a indiferença das pessoas. Contam que por várias vezes viram animais sendo alimentados por moradores, os mesmos que haviam lhes negado um prato de comida. Isso os faz sofrer.   Vários deles são viciados. Fumam, bebem, segundo eles, para espantar a tristeza, o frio, a angústia e a fome. Quando os indaguei, dizendo que pessoas ricas e que se alimentam bem procuram nas drogas as mesmas fugas que eles, ficaram chocados, perceberam que são iguais, são seres humanos, sujeitos a erros e acertos. Reconheceram que usam os entorpecentes como forma de tentarem fugir da própria consciência, o que é impossível.

Enfim, foram dias maravilhosos nos quais aprendi com cada entrevistado um pouco mais sobre a vida pessoal e profissional. Experiência que será usada como forma de transmitir idéias, valores e atitudes que todo ser humano pode e deve empreender para não trilhar a estrada da sua vida cheia de desníveis. Pude compreender também o quanto cada ser humano tem a ensinar, pelos seus erros e acertos. Aprendi que não devemos rejeitar por rejeitar, negar por negar, se ausentar por ausentar. Comprovei que o que mais machuca o ser humano não é o sermão coletivo, não é o baixo-salário, tampouco as crises materiais que enfrenta. O que mais fere é a indiferença dos outros seres, nem sempre, humanos.

E você, tem sido indiferente?

Um abraço e felicidades sempre!

 
Colunista
Paulo Sérgio Buhrer
 
 
 Contador, Consultor, Palestrante e Escritor

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